O acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) enfrenta uma semana decisiva, com a possibilidade de assinatura no próximo sábado (20), em Foz do Iguaçu. Apesar da resistência de alguns setores agrícolas europeus, o ex-negociador-chefe brasileiro Marcos Troyjo afirma que a oposição na França não é unânime e mantém otimismo quanto à conclusão do tratado.
Um passo crucial foi dado na última terça-feira (16), com a aprovação pelo Parlamento Europeu de medidas de salvaguarda para proteger agricultores e pecuaristas do bloco. Estas regras, que não integram o texto negociado com o Mercosul, visam acalmar os ânimos na França, maior produtora de carnes e grãos da UE, que busca apoios para barrar o acordo.
“A França é como se fosse uma equação. A França é igual à indústria francesa, mais as empresas de energia francesas, mais as consultorias e os bancos franceses. Todos esses atores querem o acordo, menos uma parte dos agricultores, menos uma parte do legislativo, menos ecologistas”, afirmou Troyjo, que liderou as negociações entre 2019 e 2020.
“Eu acredito que o acordo vai avançar. A minha aposta é de que ele será assinado”, completou o ex-secretário especial de Comércio Exterior.
Incógnitas e Pressões no Cenário Europeu
Apesar do otimismo, a votação no Conselho Europeu, que pode ocorrer a partir desta quinta-feira (18), ainda enfrenta incertezas. França, Polónia e Hungria são oficialmente relutantes, enquanto Áustria e Irlanda poderiam opor-se. A Bélgica anunciou que se irá abster. A posição da Itália, que concordou com a França na necessidade de um adiamento, é considerada crucial.
“Se a Itália não estiver a bordo, está tudo acabado”, disse Bernd Lange, chefe do comitê de Comércio do Parlamento Europeu. Para bloquear a assinatura, seriam necessários pelo menos quatro Estados-membros representando 35% da população da UE. Países de peso como Alemanha e Espanha são a favor.
Impacto e Visão Estratégica para o Mercosul
As salvaguardas aprovadas pelo Parlamento Europeu acenderam um alerta no setor agropecuário brasileiro. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) esclareceu que as regras não fazem parte do texto negociado, mas reconheceu que podem criar obstáculos às exportações sul-americanas.
Para Troyjo, estas exigências funcionam mais como instrumento de pressão por subsídios adicionais do que como um entrave real. Ele defende a importância estratégica do acordo para o Mercosul, argumentando que economias mais abertas têm desempenho superior.
“A experiência concreta dos países do Mercosul, particularmente das duas maiores economias, o Brasil e a Argentina, é de isolamento comercial. (…) Portanto, é crucial para o Mercosul estar mais interligado a outros mercados para diversificar o comércio”, avaliou.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, também se mostrou pragmático, afirmando que “não adianta” procurar pelo “acordo perfeito” e que o Brasil está aberto a discutir as salvaguardas de forma gradual.
A UE é atualmente o segundo maior cliente do Brasil, depois da China. Troyjo destacou que o comércio exterior representa 32% do PIB brasileiro, sublinhando a necessidade de criar alternativas e diversificar mercados.
Próximos Passos Após uma Assinatura
Mesmo se for assinado no sábado, o tratado — cujas negociações começaram em 1999 — ainda não entrará em vigor imediatamente. “Após a assinatura, o texto ainda precisará ser aprovado pelo Parlamento Europeu e pelo Congresso brasileiro. Se for aprovado por maioria simples, em ambas as casas, ele passa a entrar em vigor”, explicou Troyjo.