O prémio recorde da Mega da Virada, que pode chegar a R$ 1 bilhão, atrai milhares de apostadores todos os anos. Mas, depois da euforia do sorteio, surge uma questão crucial: o que acontece realmente com os ganhadores de lotaria e com o seu dinheiro?

Estudos académicos, como os conduzidos por Jay L. Zagorsky da Universidade de Boston, revelam uma realidade surpreendente: uma grande quantia inesperada nem sempre é sinónimo de segurança financeira perpétua. Pelo contrário, pode ser o prelúdio de problemas.

O prémio real é menor do que parece

A primeira ilusão a desfazer-se é o valor anunciado. Nos Estados Unidos, por exemplo, o vencedor de um prémio de US$ 1,5 mil milhões pode optar por um pagamento único (cerca de US$ 878 milhões) ou por uma anuidade distribuída ao longo de 30 anos. Depois, entram em cena os impostos. O governo federal e, em muitos casos, o estado de residência, retêm uma fatia considerável. No exemplo estudado, após os descontos, o valor líquido poderia ficar em cerca de US$ 606 milhões.

Para onde vai o dinheiro? A tendência para gastar

O imaginário popular associa a vitória na lotaria a uma mudança de vida radical. No entanto, pesquisas mostram que as pessoas tendem a gastar mais rapidamente o dinheiro recebido de forma inesperada. Um estudo de 2001 dos economistas Guido Imbens e Bruce Sacerdote, com Donald Rubin, indicou que os ganhadores de lotaria, analisados uma década depois, tinham poupado apenas 16 cêntimos por cada dólar recebido.

A investigação de Zagorsky vai mais longe, mostrando que indivíduos que receberam grandes heranças ou doações nas suas décadas de 20, 30 e 40 anos perderam, em média, metade do dinheiro num curto espaço de tempo, devido a gastos excessivos ou investimentos mal sucedidos. Outros estudos concluem que ganhar na lotaria frequentemente não resolve problemas financeiros de base, apenas os adia, com cerca de um terço dos ganhadores a perder tudo.

Um caso real: de herdeiro bilionário à falência

A história de Huntington Hartford serve como alerta. Herdeiro da fortuna da rede de supermercados A&P, recebeu o equivalente a mais de US$ 1,3 mil milhões (ajustado pela inflação) ainda criança. No entanto, após décadas de investimentos falhados em imobiliário, arte e entretenimento, combinados com um estilo de vida extremamente luxuoso, declarou falência cerca de 70 anos depois. Viveu os seus últimos anos de forma reclusa, longe da fortuna colossal que herdou.

A lição final: planeamento sobre euforia

As pesquisas e casos reais ensinam que dinheiro que “cai do céu” exige mais gestão do que se imagina. A tentação de esbanjar é poderosa e humana. A lição mais valiosa, independentemente de se jogar na lotaria, é que a receção de uma quantia avultada e inesperada deve ser acompanhada de planeamento financeiro rigoroso, pensamento a longo prazo e resistência ao impulso de gastar sem critério. A sorte no sorteio precisa de ser complementada com sabedoria na gestão.

Fonte: G1